29/09/2005 21h34
Divulgação: Revista OROBORO
Email recebido em 27/09/2005 de:
Assunto: Divulgação: Revista OROBORO
Câmara_de_Cultura_Antonino_Assumpção
Sent: Saturday, September 17, 2005 4:44 PM
_______________________________________
Jornal do Brasil – Caderno Idéias
Para caber o que pensar
Revista 'Oroboro' representa o Mercosul literário
Carlos Augusto Lima
Morder o próprio rabo é coisa, termo, idéia, gesto dos mais pejorativos, perigosos. Rabo, em si, já faz das suas para o que é de pior e riso. Morder o próprio é tolo. Movimento de ganância ou estultice? Atiramos pedras aos que mordem o próprio rabo. Isso é desvario e besteira pras bandas de cá. Pois os antigos, os místicos, não. Pois uma das figuras mais curiosas do simbolismo ancestral, principalmente alquímico, é o da serpente (ou dragão) que engole a si e opera um processo de contínua e dinâmica transformação. ''Meu fim é meu começo'', diz de si e, daí, a idéia do circular, do que não finda, mas, move-se num sentido e tornar-se uma outra coisa: sempre.
Nesse sentido bonito de transformação, que é próprio da vida e das coisas do mundo, apareceu Oroboro (Iluminuras), agora revista, editada pelo incansável Ricardo Corona, poeta, músico, artista gráfico, homem de multi-meios e articulações que, na década de 90 publicara outra revista não menos interessante, com o não menos interessante e sugestivo nome de Medusa. Quem lembra? Outro ícone, símbolo que faz das suas a usar das serpes, perigosas comas móveis. Oroboro é tentativa de encontro, esbarros, cruzamentos. Poesia, artes gráficas, narrativa, fotografia, quadrinhos, interferências, interdições. Cultura? Mapeamento de alguma substância criativa de arte que se produz hoje, com um alargamento de fronteiras. Estas mesmas, geográficas, geológicas, ilógicas. Para quem acredita nelas. O ponto de partida é Curitiba e, a partir daí cruzar as margens de baixo e buscar na literatura e cultura recente dos países próximos, daquilo, principalmente, o que se inventou chamar Mercosul, se lhe vale o termo. Literatura e cultura recente da Argentina, Uruguai e extensões latinas, ibéricas. Além claro, de um olhar pra cima, no eixo comum, Rio-São Paulo, e mais, mais ainda do que ver nesse país longe, coisas de Norte, de Nordeste, de Centro-Oeste, também, no que é possível e necessário. Ou seja, um respiro.
Oroboro tem apegos com uma visualidade elaborada e de cuidado, das mãos da artista plástica-gráfica Eliana Borges, responsável por pensar a revista graficamente, que coloca o que se vê numa dimensão saudável para o que é leitura, percepção, sem afetações, exageros. Aproveitamento de espaços (ou carências de), deixas para que sejam também horizontes de experimento. E como bem diz um caro amigo: a vida pode ser mais bonita em branco e preto. Oroboro faz isso funcionar.
Mais uma revista? Como mais uma? Publicar revista é sempre mais, urgente, preenchimento de carências extremas de um país de extremos, ruminante, dos desvarios com o poder, do deslumbre com o mídia, o médio. Empreitada duríssima, mas urgente. Lugares de passagem, diálogos, canais de sintonias, discursos e entraves, as revistas são locais dos ritos iniciantes de escritas e mostras de trabalhos. Efêmeras, inconstantes, rotativas, que sejam, mas que permaneçam como possibilidade, como discussão, ou simplesmente que sobrem, sumam, transformem-se. Que mordam o próprio rabo.
Oroboro tem vida curta. Oito números pensados e projetados. Agora, o mais recente, o quinto. Interessante uma revista pensada já na sua finitude, no seu limite, com a idéia de não durar, mesmo. O que virá depois? Saberá? Quem saberá?
Carlos Augusto Lima é autor de Objetos (Alpharrábios Edições, 2002) e Eu me satisfaço com a minha casa e o deserto (no prelo).
Publicado por Edvaldo Rosa
em 29/09/2005 às 21h34